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Vinho decente a R$ 10 no Brasil?

É muito difícil, mas a linha Classic da Salton mostra que os duros têm ao menos uma opção

Marcos Pivetta/www.jornaldovinho.com.br

28/10/2007

Não sei se você reparou, mas quase ninguém fala dos vinhos finos de R$ 10. Faz sentido. Os rótulos que custam esse valor no Brasil são, em sua imensa maioria, absolutamente esquecíveis, muitos são dispensáveis mesmo. Falo isso não por elitismo, mas por constatação empírica. Desse valor para baixo, ou seja, o mundo dos tintos e brancos de um dígito, quase que só há vinho fino ruim ou feito com uva não-vinífera (este último dono de um grande mercado cativo, que busca muito mais preço que qualidade). Não é de se estranhar, portanto, que quase ninguém se dê ao trabalho de citar os numerosos exemplares que formam a base do mercado.

Na França, na Itália, em Portugal e em quase todo país com uma vitivinicultura forte, é possível, com um de pouco de conhecimento e força de vontade, garimpar rótulos ao menos decentes em meio ao oceano de vinhos ruins que inundam essa modestíssima faixa de preço. Vinhos que não farão ninguém sonhar, mas que podem ser honestos e bebíveis no dia a dia. Um exemplo? O tinto português Periquita, muito consumido no Brasil, que nas terras lusas custa entre 3 e 4 euros. Menos de R$ 10 lá (e aqui mais ou menos o dobro). Haveria muitos outros exemplos, mas não vamos cansar o leitor.

No Brasil, quem está conseguindo fazer vinhos honestos a cerca de R$ 10 é a Salton, com sua linha de varietais Classic. Isso apesar dos altos impostos e da falta de escala que assola o setor de vinhos como um todo em terras nacionais. Em 1999, ano de uma boa safra no Brasil, os tintos e brancos Classic representavam o topo de qualidade da empresa e custavam mais do que atualmente. Com um aroma mentolado muito marcante, o Salton Classic Cabernet Sauvignon 1999, ainda lembro bem dele, era então o melhor vinho da empresa. Hoje, oito depois, os Classic foram rebaixados à condição de linha mais básica entre os produtos de qualidade da Salton e ofuscados por outra linha, a Volpi, e os top da casa, o Salton Desejo e o Talento. Mas sua qualidade, embora num estilo mais ligeiro, se manteve em níveis aceitáveis – e, milagre no mercado nacional, o preço caiu.

Ok. Os Classic são vinhos simples, de corpo entre o leve e o médio, para consumo rápido e descompromissado. Que ninguém compre esses vinhos esperando impressionar os amigos em degustações ou jantares. São vinhos para se tomar numa segunda-feira à noite com a comida que sobrou do fim de semana. Os tintos –três varietais, um Merlot, um Cabernet Sauvignon e um Tannat – passam entre 3 e 6 meses em madeira. E todos são decentes, sobretudo das safras 2004 e 2005. Melhores que muitos chilenos, argentinos e outros nacionais de preço semelhante ou superior. Os brancos, com exceção do Chardonnay, não estagiam no carvalho. Meu favorito é o Gewurztraminer, que apresenta boa tipicidade. O da safra 2005 tinha os aromas clássicos dessa difícil uva: rosas e lichia. Não entendo por que esses vinhos não são vendidos em bag in box de 3 ou 5 litros. Dessa forma, restaurantes populares poderiam comercializar vinhos honestos em taça a preços módicos.

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