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Relíquias de um passado divino

Jarros semelhantes aos usados por Jesus no milagre da transformação da água em vinho são um dos destaques de exposição

Marcos Pivetta/www.jornaldovinho.com.br*

21/10/2008

Jarros contemporâneos do período em que Jesus viveu (Foto: Divulgação/Calina)

A passagem, do Novo Testamento, é conhecida de todos, mesmo dos que não têm religião. No meio da festa que celebra um casamento em Caná, na Galiléia, para o qual Maria, Jesus e os discípulos foram convidados, o vinho acaba. Ciente da gravidade da situação, Maria pede ao filho para ajudar os noivos. Uma boda sem vinho seria uma desonra para os recém-casados. A princípio, Jesus hesita em intervir, mas cede ao apelo materno. Pede que encham com água seis talhas de pedra normalmente usadas em rituais judaicos de purificação – e faz seu primeiro milagre: transforma a água em vinho. O melhor vinho da boda, muito superior ao servido no início da festa, segundo o Evangelho de São João, o único a contar a história na Bíblia. “Todos servem primeiro o vinho melhor e, quando os convidados já estão embriagados, servem o vinho pior. Mas tu guardaste o vinho bom até agora!”, diz ao noivo o mestre-de-cerimônias da festa, que ignora a origem divina da nova partida da bebida.

Quem gosta de vinho e história e estiver em São Paulo em outubro tem a chance de ver como eram as talhas usadas na antiga Galiléia, região hoje situada no norte de Israel, na época em que Jesus fez o milagre da boda de Caná. Em cartaz até o próximo dia 26 no Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (Masp), a exposição “Tesouros da Terra Santa – Do Rei David ao Cristianismo’ traz 150 achados arqueológicos do Museu de Israel, em Jerusalém. Entre as peças, que pesam 15 toneladas e cobrem cerca de 1600 anos da história da região, estão seis jarros de pedra contemporâneos à época em que Jesus viveu. A pequena mostra, que pode ser visitada sem correria em cerca de uma hora, não é específica sobre objetos ligados ao vinho. Mas, dada a importância cultural e religiosa que a bebida teve (e tem) no judaísmo e no cristianismo, alguns artefatos se relacionam com o vinho. Além das talhas de pedra, há também uma mesa com utensílios antigos, inclusive recipientes para líquidos, que faz (vaga) referência ao cenário da Santa Ceia, no qual houve consumo de vinho.

A exposição é dividida em três grandes momentos históricos: o período israelita (1000 a.C a 586 a.C), a fase do Segundo Templo (Templo de Heródes) (538 a.C a 70 d.C) e o final do domínio romano mais o período bizantino (70 d.C a 640 d.C). Há peças arqueológicas de destaque referentes a cada uma dessas etapas históricas. Do primeiro período, que enfatiza a vida cotidiana dos israelitas, suas casas e tarefas domésticas, o foco central é o estabelecimento da Casa de David (A Monarquia no Reino de Judah) e o Templo de Salomão (Primeiro Templo). O nascimento do cristianismo e trechos da vida de Jesus, como os retratados na Boda de Caná e na Santa Ceia, além de seu julgamento e crucificação, fazem parte do segundo período. Ainda nesse segmento da mostra, é possível ver uma rocha com a inscrição do nome de Pôncio Pilatos, que seria uma prova material da presença na Judéia do governador romano que autorizou a morte de Jesus. No terceiro e último período, o ponto alto é a reconstituição do interior de sinagogas e igrejas, com seus capitéis, rosetas, pisos e outros detalhes arquitetônicos. É impressionante ver que, nesse momento da história, judaísmo e cristianismo adotam uma arquitetura bastante semelhante em seus locais de culto – sem abrir mão, é claro, de suas particularidades. No lugar da cruz das igrejas cristãs, as sinagogas exibem o menorá, o candelabro de sete braços que é símbolo da fé judaica.

Serviço

Exposição: Tesouros da Terra Santa – do Rei David ao Cristianismo

Local: Masp, Av. Paulista, 1578, Cerqueira César, São Paulo

Horário: de terça-feira a domingo e feriados, das 11h às 18h; na quinta-feira até as 20h. A bilheteria fecha uma hora antes do fim da exposição. A mostra fica em cartaz até 26/10.

Preço: R$ 15 (inteira) e R$ 7,00 (estudante). Menores de 10 anos e maiores de 60 anos não pagam entrada. Na terça-feira, a entrada é gratuita até as 18h.

*Esta matéria foi originalmente publicada na edição de outubro de 2008 do jornal Bon Vivant

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