A internacionalização da Miolo
Com parcerias no exterior e consultoria do francês Michel Rolland, vinícola ganha mercado e respeito fora do Brasil
Marcos Pivetta/www.jornaldovinho.com.br
06/09/2007
“Estes vinhos têm caráter, embora me acusem sempre de fazer vinhos iguais. Costumo brincar que não há bons enólogos, há boas uvas. Mas há quem faça vinho ruim com uvas boas.” As frases são do francês Michel Rolland, o consultor mais famoso, influente e polêmico do mundo que presta assessoria à Miolo desde 2003. Como tem feito nos últimos anos, Rolland veio ao Brasil em julho para lançar cinco vinhos de alta gama da crescente linha de produtos da vinícola gaúcha: Lote 43 2004, Merlot Terroir 2005, RAR 2004, Gran Lovara 2005 e Quinta do Seival Cabernet Sauvignon 2005. O Gran Lovara apresenta uma peculiaridade mercadológica: é o primeiro vinho nacional a ter o rótulo impresso em braile, tornando-o acessível para um público normalmente esquecido por tudo e todos, os deficientes visuais. Os cinco vinhos, é claro, foram elaborados sob a batuta do enólogo gaulês, originário do Pomerol, sub-região de Bordeaux onde a Merlot reina absoluta. Merlot que, aliás, Rolland – e muito enólogos do Brasil – acredita ser a variedade mais bem adaptada aos vinhedos gaúchos. “Aparentemente, a Merlot está se saindo muito bem no Brasil. Ela dá um vinho redondo, mas que pode envelhecer”, afirma o consultor, que hoje presta consultoria a empresas de 14 países (já foram 18) e em todos eles faz vinhos com sua uva do coração. “Precisamos fazer o melhor Merlot possível para vermos qual é o teto de qualidade dessa cepa no Brasil, para vermos se podemos competir no mercado exterior entre os produtos de alta gama.”
Entre as vinícolas nacionais que ambicionam claramente o mercado exterior, a Miolo é, sem dúvida, uma das mais agressivas. Em seu plano estratégico, a empresa planeja entrar 2012 exportando 30% de sua produção. A meta pode parecer exageradamente otimista, mas os primeiros resultados já aparecem. No primeiro semestre de 2007, a Miolo – que faz parte da associação Wines from Brazil, grupo de vinícolas nacionais que miram o mercado externo – mandou para fora do país 233 mil garrafas de vinho, 250% a mais do que durante o mesmo período do ano passado. E não se pode esquecer que 2006 já tinha sido um bom ano para a Miolo, visto que as exportações responderam por 7% do faturamento da empresa. Atualmente a vinícola, que no início desta década não vendia uma garrafa para fora do país, despacha seus vinhos para 20 países, com destaque para os Estados Unidos, onde está presente em 30 estados.
Esse movimento rumo ao exterior não é um lance de sorte. A Miolo, que deve faturar R$ 90 milhões em 2007, tem tomado uma série de decisões para pavimentar sua internacionalização e construir uma marca global. O nome oficial da vinícola, por exemplo, agora é Miolo Wine Group. Assim mesmo, em inglês, o idioma do comércio exterior. Num lance ousado, a empresa – que já mantinha há tempos uma parceria em âmbito nacional com a Lovara, a divisão vinícola do grupo Bentec, também de Bento Gonçalves – fechou recentemente acordos com dois grupos vinícolas do exterior. Em 2005, firmou uma associação com a Via Wines, do Chile, dando origem à joint-venture Via Sul. Em 2006, fechou uma parceira coma a Osborne, da Espanha. Ao lado da Via Wines, a Miolo produz e importa algumas linhas de vinhos no país sul-americano e, para lá e para outros mercados internacionais, manda alguns de seus produtos elaborados em terras nacionais. Associada aos espanhóis, a Miolo produz um brandy na propriedade que mantém com a Lovara no Vale do São Francisco, no Nordeste, e importa e distribui no Brasil os vinhos ibéricos da Osborne.
Na busca por novos clientes no exterior, Rolland desempenha um importante papel, que, na prática, extrapola a função técnica de consultor. Além da assessoria prestada na condução dos vinhedos e na elaboração dos vinhos, o francês funciona também como um ótimo cartão de visitas para compradores de todas as latitudes, inclusive no mercado interno. Uma espécie de atestado de qualidade de um vinho – ou ao menos de modernidade de um vinho, já que seus tintos e brancos miram o gosto do consumidor contemporâneo. No meio vinícola, não há quem não o conheça. Para o bem ou para o mal. Alguns o amam, outros o odeiam. Mas ninguém se mantém indiferente à sua presença. Rolland é um sujeito simpático e carismático, dotado de grande tino comercial e sem pudores de se mostrar imodesto. “Mudamos a geografia do vinho nacional nos últimos oito anos’, diz Adriano Miolo, diretor-técnico da Miolo. “Investimos R$ 90 milhões nas cinco principais regiões brasileiras em que fazemos vinhos (Vale dos Vinhedos, Serra Gaúcha, Campanha, Campos de Cima da Serra e Vale do São Francisco).” O movimento rumo ao exterior também encontra eco junto aos críticos internacionais de peso. Recentemente, a equipe da jornalista inglesa Jancis Robinson, papisa do vinho ao lado do norte-americano Robert Parker, se deu ao trabalho de avaliar os alguns dos melhores vinhos brasileiros, entre os quais havia quatro rótulos da Miolo.
*Esta matéria foi originalmente publicada na edição de agosto de 2007 do jornal Bon Vivant
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