A feira que virou pop
Expovinis 2010 teve grande presença de vinícolas brasileiras e personagens da TV, como Galvão Bueno
Marcos Pivetta/www.jornaldovinho.com.br*
17/06/2010
Pânico na TV, Galvão Bueno e vinho brasileiro. Seria um claro exagero nacionalista resumir a edição deste ano da Expovinis, que ocorreu em São Paulo entre os dias 27 e 29 de abril, com esses três destaques da ala verde-amarela. Afinal, a França novamente compareceu ao evento com uma delegação de respeito, assim como Portugal, Argentina e algumas regiões da Espanha. E havia ainda os tradicionais stands dos importadores, novos e antigos, pequenos e grandes. Mas, tomando emprestado o bordão favorito do brasileiro mais famoso e poderoso do momento, o presidente Lula, nunca na história deste país o ibope do vinho, inclusive do nacional, esteve tão em alta. Quando dois fenômenos da audiência televisiva se cruzam numa feira de vinho na capital paulista (o povo do Pânico para, como sempre, fazer seu humor escrachado e Galvão para lançar um tinto e um espumante brasileiros elaborados em parceria com a Miolo), isso é um sinal de que algo está acontecendo com a imagem da bebida em solo pátrio. Elitista quase que por natureza, o vinho virou um assunto pop e ampliou suas fronteiras.
A feira deste ano parece ter intensificado algumas tendências que já despontavam na edição de 2009, quando, depois de anos de relativa timidez, os produtores brasileiros finalmente deram sua primeira grande investida na Expovinis. Agora, com certa folga, é possível dizer que os espaços ocupados por vinícolas nacionais foram os mais concorridos do evento. Uma mudança e tanto em relação aos primeiros anos da feira, quando quase tudo se resumia a rótulos do exterior expostos em stands de importadores ou de produtores de fora à procura de um representante comercial no Brasil. “A boa presença dos produtores do Brasil na Expovinis se deve a um esforço do Ibravin (Instituto Brasileiro do Vinho) que vem sendo feito nos últimos cinco anos”, afirmou Domingos Meirelles, diretor da Exponor Brasil, empresa organizadora do evento. “No passado, havia quem acusasse a feira em São Paulo de ser um polo difusor do vinho importado. Aos poucos, essa visão foi se alterando. Hoje a feira é vista pelas vinícolas brasileiras como uma importante ação de marketing”. Segundo Meirelles, a presença de público neste ano na Expovinis foi similar à de edições anteriores: cerca de 16 mil pessoas visitaram os 250 stands da feira. O primeiro dia do evento, reservado a profissionais do setor, foi o de maior afluência de pessoas.
Os produtores brasileiros compareceram à feira em stands de todos os tipos. Havia uma espaço grande e coletivo, com mais de 500 metros quadrados, organizado pelo Ibravin, em que 44 vinícolas nacionais (do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina e do Nordeste), expuseram seus rótulos. Segundo o Ibravin, onze vinícolas nacionais participaram pela primeira vez da feira, algumas delas recém-criadas, como as gaúchas Sozo (da região de Campos de Cima da Serra), a Guatambu (de Dom Pedrito, na Campanha) e a catarinense Krans (de Treze Tílias). “Fizemos bons contatos na feira”, disse o enólogo Gilberto Pedrucci, da Casa Pedrucci, de Garibaldi, outra pequena vinícola que debutou na Expovinis. Além do stand do Ibravin, vinícolas grandes (Miolo, Salton, Aurora e Valduga) e pequenas (Lidio Carraro e Pizzato) que há anos participam da feira também não deixaram de comparecer nesta edição. A quantidade de novos vinhos lançados por essas empresas foi impressionante: um tinto e um espumante da linha 100 Anos da Salton; Merlot DNA 99 (safra 2005) da Pizzato; nova linha Almadén, agora feita pela Miolo; vários novos rótulos de Encruzilhada do Sul da Lidio Carraro. Como no ano passado, o Brasil também fez bonito na escolha dos melhores vinhos da feira, no concurso Top Ten. Os jurados elegeram o Villagio Grando 2008, feito pela vinícola Villagio Grando de de Santa Catarina, o melhor Chardonnay da feira, batendo seus concorrentes do exterior. O título de melhor tinto nacional foi para o Sesmarias 2008, da Miolo, e o de melhor espumante brasileiro para o Gran Legado Brut.
Entre os expositores estrangeiros, chamou atenção novamente o grande stand da França, onde não faltaram produtores em busca de um importador. “Se não entrarmos no mercado brasileiro agora, daqui a quatro anos será muito tarde”, disse Philippe Maurette, da AmVM, empresa francesa especializada na exportação de rótulos de várias regiões gaulesas. Maurette já tinha estado na Expovinis de 2009, mas, devido à crise econômica na Europa, preferiu investir em mercados mais tradicionais e não continuou o trabalho de prospecção no Brasil. Voltou neste ano à feira disposto a realmente comercializar seus vinhos por aqui. O produtor Marcel Georges, dono do Domaine du Château de L’Hers, na região de Châteauneuf-du-Pape, no sul do Vale do Rhône, estava impressionado com o perfil do público que veio provar seus rótulos. “Há muitos jovens brasileiros que se interessam por vinho”, comentou Georges, cujo tintos e brancos entraram no ano passado para a carta de vinhos do Palácio do Eliseu, em Paris, a residência oficial do presidente da França e sede do governo. Num evento do porte da Expovinis, é impossível agradar a todos os expositores. O espanhol Francisco Pardo Tolosa, da bodega Pardo Tolosa, que tinha um pequeno espaço dentro do stand coletivo da região de Castilla-La-Mancha, chegou ao último dia da feira com cara de poucos amigos. “Recebi muitas visitas de enófilos, donos de restaurantes, jornalistas, mas poucas de importadores”, esbravejou Pardo Tolosa. Domingos Meirelles, da Expovinis, tem uma resposta pronta para esse tipo de queixa: “Numa feira, o importante é mostrar seus produtos para as pessoas. Se um dono de restaurante ou enófilo gostar do vinho, ele vai falar com um importador para trazer esse rótulo para o Brasil”.
Na adega com Galvão
Locutor esportivo apresenta vinhos de sua vinícola na Expovinis
Os críticos de Galvão Bueno provavelmente gostariam de vê-lo devidamente engarrafado, arrolhado e posto de lado para envelhecer por anos no canto mais escuro de uma adega secreta. Bem, amigos, eis a má notícia para os detratores do locutor esportivo mais polêmico do Brasil: Galvão continua solto e agora virou até produtor de vinhos. Em parceria com a Miolo, e com consultoria do francês Michel Rolland, lançou dois rótulos, um tinto da safra 2009 (Bueno Paralelo 31) e um espumante (Bueno Cuvée Prestige), que carregam o nome de sua vinícola, a Bellavista Estate Bueno, situada na Campanha Gaúcha, perto da fronteira com o Uruguai. O tinto é um corte (blend) de uvas Cabernet Sauvignon (60%), Merlot (30%) e Petit Verdot (10%) oriundas de vinhedos da Fortaleza do Seival, a propriedade da Miolo em Candiota, na Campanha Gaúcha. O espumante é um blend elaborado com uvas Pinot Noir e Chardonnay plantadas em Garibaldi, dentro do Vale dos Vinhedos, na Serra Gaúcha. “É a realização de um sonho”, disse o sorridente Galvão, apreciador dos tintos de Bordeaux, no dia 27 de abril, quando esteve no stand da Miolo da Expovinis para promover seus rótulos. Oficialmente, os vinhos do Galvão serão lançados apenas em agosto. Mas o locutor é notícia por onde passa e sua visita à feira provocou deslocamentos de ar e de pessoas ao seu redor.
Uma pequena alternativa
Feira Expovinhoff reúne 17 expositores em São Paulo em evento na semana da Expovinis
No dia 26 de abril, véspera do início da Expovinis, o Espaço Pandoro, em São Paulo, foi palco da primeira edição de um pequeno evento de vinhos, a Expovinhof, organizado pela jornalista Fernanda Fonseca e por Beto Duarte. A minifeira, que reuniu 17 expositores, entre os quais uma vinícola nacional (Lidio Carraro), se propõe a ser um evento independente e (quase) pararelo à Expovinis, nos moldes dos que ocorrem na Itália e na França em datas próximas à Vinitaly e à Vinexpo. A data da Expovinhoff foi escolhida justamente na semana da Expovinis para aproveitar a presença na capital paulista de enófilos, donos de restaurantes, proprietários de importadores e jornalistas de todo o país. Além da oportunidade de degustar vinhos de pequenas importadoras, como a SmartBuys Wines (que traz ao Brasil uma boa seleção de rótulos da Califórnia), a Cave Jado (só vinhos franceses) e a Empório Sorio (vinhos da Córsega), a Expovinhoff promoveu uma série de palestras com produtores e especialistas em vinho. Sempre é possível apontar pequenas falhas de organização na estreia de uma feira alternativa. Mas deslizes são normais em iniciativas que acabaram de nascer. O importante é a Expovinhoff não ficar apenas na primeira edição. Que haja uma segunda feira em 2011 e que outros a imitem.
*Esta matéria foi originalmente publicada na edição de maio de 2010 do Bon Vivant.
- Na direção da fronteira
- Sob o sol da Índia