Espumantes nacionais
Eles melhoram, alguns são mesmo bons, mas ainda falta alguma coisa
Marcos Pivetta/www.jornaldovinho.com.br
22/04/2006
Costuma-se dizer que a Serra Gaúcha, com seus solos ácidos e onde normalmente chove bastante nos meses da colheita, tem vocação para a produção de vinhos borbulhantes. Sem dúvida, há produtores nacionais capazes de fazer bons espumantes. Mas, se a região brasileira é realmente a segunda melhor zona do mundo para a fabricação desse tipo de vinho, como acreditam algumas pessoas, esse potencial ainda precisa ser mais bem explorado. Os espumantes melhoram e não são ruins, não. Mas, a meu ver, persiste uma certa inconstância de qualidade entre alguns produtores, a despeito de uns poucos terem aparentemente se firmado como fornecedores de espumantes bastante confiáveis. Essa é pelo menos a impressão que fica de uma degustação de oito espumantes nacionais, todos do tipo brut (seco), realizada na noite de 8 de fevereiro passado, na Associação Brasileira de Sommeliers de São Paulo (ABS-SP).
O painel reuniu os espumantes que se destacaram de uma amostra de 27 rótulos nacionais, que haviam sido comprados em São Paulo e degustados por diretores e sócios da ABS-SP (eu não participei dessa etapa seletiva, apenas estive na degustação dos oito finalistas). É lógico que outras pessoas, analisando outras garrafas e outros rótulos, chegariam provavelmente a um resultado diferente da pré-seleção feita pela entidade paulista. Eu, por exemplo, senti falta entre os finalistas do espumante brut da Marson e de algum rótulo da boa linha da Don Giovanni. Mas escolhas são escolhas. Não se quer aqui (falo por mim, não pela ABS-SP, da qual não sou sócio) eleger o melhor espumante brasileiro. Apenas formar uma opinião sobre a qualidade média da elite dos espumantes nacionais.
E o que se pode dizer a respeito dos oito finalistas? Houve surpresas e rótulos esperados entre os participantes dessa prova. No time das surpresas, destacaram-se as presenças do Château Lacave e do Almadén, dois espumantes que não costumam figurar nas listas dos melhores nacionais. Entre os rótulos esperados, apareceram o Chandon Brut, Chandon Excelence, o Salton Évidence, o Cave Geisse Brut safra 2003 e o Casa Valduga Brut Champenoise 2002 e o Miolo Brut. No geral, achei que os melhores tinham um bom nível, mas esperava que mais rótulos estivessem num patamar parecido de qualidade. Como se sabe, espumantes são vinhos frágeis, que, se não forem bem acondicionados, perdem seus frescor e a qualidade cai rapidamente. Além disso, os espumantes nacionais, como quase todo produto desse tipo, não são feitos para envelhecer. E alguns degustados na prova pareciam já ter passado do ponto.
A ABS-SP deve publicar em breve um guia com os resultados do júri popular que participou da prova com os espumantes. Aviso os leitores que não costumo descrever em detalhes as borbulhas dos espumantes, pois elas, embora imprescindíveis nesse tipo de vinho, não são um bom parâmetro de qualidade. As pesquisas científicas mostram que o borbulhamento tem mais a ver com características dos copos que dos vinhos analisados.
Abaixo o meu ranking particular da degustação, que foi às cegas, mas os participantes sabiam o nome dos oito espumantes pré-selecionados. A faixa de preços dos vinhos foi pesquisada na internet em abril. Para entender o sistema de cotação de vinhos aqui usado, consulte esta página.
Salton Évidence (12% vol., R$ 35/40) – O meu favorito da noite. Corte (mistura) de 70% de Chardonnay e 30% de Pinot Noir. Cerca de 20% do vinho base foi fermentado e mantido com as leveduras em barricas de carvalho francês por 6 meses. Feito pelo método champenoise, com a segunda fermentação na garrafa, é o espumante de topo da linha da Salton. Cremoso, com aromas de flores, fermentos e baunilha e coloração puxando mais para o amarelo. Em outras degustações, esse espumante também já havia me chamado atenção. ***½ BOA COMPRA
Cave Geisse Brut, safra 2003 (12% vol., R$42) – Rótulo intermediário de um dos melhores produtores nacionais de espumantes, a Cave de Amadeu, que só produz vinhos borbulhantes, bem secos e austeros, pelo método champenoise (com exceção, é claro, do doce Moscatel deles). Corte de Chardonnay e Pinot Noir, que, depois de terminada a fermentação, fica no mínimo um ano e meio em contato com as leveduras. Formou uma bela perlage no copo. Sua cor é um amarelo-palha. Arora meio tímido, de flores, cítricos e fermentos. ***
Chandon Excelence (11,7% vol., R$ 60/70) – Rótulo sempre presente na lista dos melhores espumantes nacionais. Feito pelo método charmat, com a segunda fermentação em autoclaves (tanques de aço inox). Corte de Chardonnay e Pinot Noir. Cor não muito carregada, entre o verdeal e o amarelo claro. Aroma muito delicado, de flores e frutas brancas. Aliás, delicado é uma boa palavra para descrever esse espumante, que, para o meu gosto, poderia ter um pouco mais de corpo. Bom, mas caro. ***
Château Lacave Brut (12% GL, R$ 30)– Uma grata surpresa entre os finalistas. Este rótulo, saído do belo castelinho desse produtor de Caxias do Sul, é feito apenas com a uva Chardonnay, pelo método champenoise. Cor verdeal, com boa perlage.Aromas cítricos e de fermentos. Estilo austero e direto. **½
Chandon Brut (11% vol, R$ 30) – Irmão menor do Excelence, com o qual guarda alguma semelhança no estilo leve e delicado. Corte de Chardonnay, Pinot Noir e Riesling Itálico, feito pelo método Charmat. Aromas de flores e cítricos. Passou meio rapidamente pela boca. **½
Miolo Brut (12% vol., R$ 22) – Corte de Chardonnay e Pinot Noir, feito pelo método champenoise, este espumante é, para mim, um caso clássico de rótulo marcado por altos e baixos. Já tomei bons e ruins em várias ocasiões. O da degustação na ABS não estava entre os melhores, apesar da boa perlage. Tinha aromas tímidos e de bom ainda conservava algum frescor. **
Casa Valduga Champenoise 2002 (12% vol., R$ 30/35) – Não fez jus à fama (justificada) dos Valduga de produzir bons espumantes. Este corte de Chardonnay e Pinot Noir apresentou-se meio passado, devido provavelmente à idade ou à má conservação da garrafa. Alguém do meu lado disse que tinha “cheiro de champanhe velha”. E tinha mesmo. Talvez devesse ter sido desconsiderado da prova por má conservação. **
Almadén Brut (12% vol., R$ 18/20) – Corte de Pinot Noir, Chardonnay e Riesling Renano. Aromas de maçã verde e cítricos. Cor verdeal. Meio “verde” e adstringente. Método charmat. **
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