JV

A imprensa do vinho

Maior interesse do consumidor pela bebida faz surgir novas publicações

Marcos Pivetta/www.jornaldovinho.br*

15/02/2006
Boom na imprensa vínica: duas revistas, Adega e Wine Style, e um jornal, Vinho&Cia, lançados em 2005 (Foto: Marcos Pivetta)
Boom na imprensa vínica: duas revistas, Adega e Wine Style, e um jornal, Vinho&Cia, lançados em 2005 (Foto: Marcos Pivetta)

Nunca a imprensa falou tanto de vinho. E não só nas páginas de gastronomia, nas quais tintos, brancos e espumantes são assunto obrigatório para os amantes da boa mesa. Onde menos se espera a bebida é notícia. Na edição de 3 agosto da revista Veja, a seção Radar, um prestigiado espaço que publica notas exclusivas a respeito da vida dos poderosos e sobre os bastidores da política e da economia nacionais, dedicou algumas linhas à joint-venture firmada entre a Miolo e a chilena Via Wines. Em meio a pequenos textos que davam conta dos movimentos de coxia desencadeados pela crise do mensalão, e até um informando que o craque Ronaldo, o Fenômeno, corria o risco de ser processado por seus ex-empresários, aparecia a notinha vínica, sob o título “Um Miolo chileno”.

Como quase toda a imprensa não-especializada, Veja, sempre falou (um pouco) de vinho. Mas, em outras épocas, a maior publicação semanal do país dificilmente incluiria o tema na concorrida e prestigiada seção Radar. No passado não muito distante, também era difícil encontrar colunas com periodicidade fixa totalmente dedicadas ao nobre fermentado nos grandes e pequenos jornais e revistas do Brasil afora e vinho na televisão era um tema raro. Hoje, não mais. Tudo mudou – e para melhor. Quem não fala do fermentado de uvas está por fora do mundo do século 21. Agora, o multifacetado universo do vinho rende reportagens (e anúncios) para todos os tipos de meios de comunicação, rádio, TV, veículos impressos e virtuais. Além das clássicas e dominantes pautas de gastronomia, serve de mote para reportagens de economia, de política agrícola, de saúde, de estilo de vida, de ciência … E mais do que isso: a bebida cresceu tanto em prestígio e em número de seguidores que exibe robustez suficiente para gerar sua própria imprensa. Se não é a melhor da história, a safra 2005 de meios de comunicação dedicados exclusiva ou prioritariamente ao vinho é das mais alvissareiras. Duas revistas, Adega e Wine Style, e o Jornal Vinho&Cia foram lançados neste ano. Isso sem mencionar a criação no ano passado de uma seção voltada ao vinho no site da revista Veja São Paulo. É lógico que não se trata do primeiro endereço eletrônico na Internet brasileira dedicado ao vinho. Para ficar em apenas dois exemplos, a Academia do Vinho/www.academiadovinho.com.br e o site Winexperts/ www.winexperts.terra.com.br são projetos virtuais bem mais antigos e abrangentes. Mas a iniciativa da Veja São Paulo tem por trás uma das grandes grifes do jornalismo brasileiro.

Os novos títulos especializados vêm se somar às veículos pioneiros do setor de vinhos, caso do jornal Bon Vivant, surgido há sete anos, e da revista Vinho Magazine, que chegou às bancas em 1999, e também às publicações dedicadas à gastronomia em geral, como a Gula (com doze anos de vida), a Prazeres da Mesa e a Alta Gastronomia. “A concorrência hoje é forte”, afirma o jornalista Eduardo Viotti, um dos editores da Vinho Magazine. “O público consumidor da bebida tem dinheiro para comprar várias revistas, mas pode haver uma saturação das verbas publicitárias.” Preocupações à parte, a briga por mentes e corações do consumidor apaixonado pelo fermentado de uvas promete ser boa. Colocando lado a lado antigas e novas publicações, uma coisa fica clara: a mídia do vinho é bem diversificada, mais ou menos como o mercado nacional da bebida. Em suma, tem revista ou jornal para todo e qualquer gosto. Alguns adotam abordagens mais técnicas em sua reportagens, outros primam pela descontração em seus textos e há quem prefira o meio termo no trato das pautas etílicas, nem muito sisudo, nem muito informal. Abaixo um breve perfil de novos e velhos (velhos não, melhor dizer evoluídos ou amadurecidos) representantes da imprensa a serviço de Baco:

Wine Style — Lançada em maio deste ano pela editora Empyreus, de São Paulo, a revista, de periodicidade bimestral e 68 páginas editoriais, adota o slogan “o vinho tratado com inteligência”. Seria uma provocação ao QI das demais publicações do setor? Um dos editores da Wine Style, o pediatra e jornalista Arthur Azevedo, garante que não. “Não somos melhores nem piores do que as outras revistas”, diz Azevedo, que também é um dos diretores da seção de São Paulo da Associação Brasileira de Sommeliers (ABS-SP). “Somos diferentes.” Aliás, praticamente todos os textos da publicação, que tem distribuição nacional e tiragem de 10 mil exemplares, são assinados por diretores da entidade, em sua maioria médicos. “A revista não é da ABS-SP, mas tem a cara da ABS-SP”, resume Azevedo. A proposta editorial da Wine Style é ser um veículo de caráter mais técnico, aprofundado. Em suas páginas, entre o relato de uma ou outra degustação, antes ou depois de uma matéria de enoturismo, ao lado do perfil de um tipo de tinto ou branco ou de um produtor, há, por exemplo, espaço para alentadas reportagens sobre os benefícios à saúde do consumo moderado de vinho ou sobre os possíveis efeitos benéficos ou deletérios que a polêmica levedura Brettanomyces pode ter nos aromas da bebida. Tal gama de assuntos densos não quer dizer que a Wine Style se destine apenas aos iniciados no tema. “Queremos informar bem quem tem e quem não tem conhecimento sobre vinhos”, afirma Azevedo, que sentencia. “O foco da revista é vinho. Não publicamos matérias sobre esportes, nem mesmo receitas culinárias.” A publicação custa R$ 8,90 nas bancas e também pode ser adquirida por meio de assinatura.

Jornal Vinho&Cia — Com textos noticiosos curtos e simples, espaço para crônicas bem-humoradas e comentários leves produzidos por um time colunistas, o veículo é a antítese da Wine Style, embora não seja correto comparar uma revista a um jornal. Também lançado em maio de 2005, Vinho&Cia tem periodicidade mensal, vinte páginas editoriais e 10 mil exemplares de tiragem. Publicado pela ConVisão, uma editora sediada em Alphaville, município de Barueri, na Grande São Paulo, o jornal, cujo lema é “o lado descontraído da vida”, reflete a visão de sua dupla de editores, os engenheiros e enófilos Regis Gehlen Oliveira e Lauro Carvalho. “Minha idéia era fazer uma publicação sem preconceitos, democrática, que tirasse a gravata do vinho”, diz Carvalho, que já foi dono de restaurante em Niterói, no Rio de Janeiro, e hoje mora em São Paulo. “As pessoas querem beber bons vinhos, mas nem todos se interessam em descobrir o que é acidez ou que tipo de tinto dá a uva Tannat.” A informalidade dá o tom do jornal. Se o assunto de uma reportagem é harmonização de vinhos e comidas, Vinho&Cia está mais interessado em dar dicas sobre produtos que vão bem com pratos ao alcance de todos, como um bom churrasco ou uma saborosa pizza, do que em sugerir a bebida perfeita para acompanhar ovas de esturjão ou foie gras. A circulação do jornal se concentra na Grande São Paulo, onde é distribuído gratuitamente em alguns eventos e enviado a hotéis, importadores e produtores nacionais de vinho. A publicação também pode ser encontrada em Campos do Jordão, no interior paulista, e em Parati, no litoral fluminense. “Mas temos assinantes de vários outros estados, como Minas Gerais e até do Maranhão”, comenta Carvalho. Cada exemplar custa R$7 e a assinatura anual, R$70,00.

Adega — Caçula entre os títulos que formam a imprensa báquica nacional, a publicação mensal fez sua estréia nas bancas de jornais e revistas em agosto passado. Projeto da Inner Editora, que tem escritórios no Rio de Janeiro e em São Paulo, Adega, de acordo com seu slogan, é “a revista do vinho e outros prazeres”. O que seria exatamente um veículo que se define dessa maneira? Com a palavra, o escritor e especialista em vinhos, Marcelo Copello, editor-chefe da publicação. “Adega é uma revista de variedades sobre vinho”, resume ele. Sem dúvida, o foco central do veículo, que custa R$ 9,90 e exibe 84 páginas, é a mais nobre das bebidas alcoólicas. Dicas de tintos, brancos, espumantes e fortificados para todos os bolsos e gostos, crônicas, reportagens sobre um produtor mítico (no número um, o escolhido foi o Château Mouton-Rothschild, um premier cru classé de Bordeaux), artigos com informações mais técnicas (o que é biodinâmica, ou como foi a safra 2005 no Brasil), textos sobre harmonização de vinhos e comida – tudo isso faz parte da pauta da revista. Isso e muito mais. Na visão dos editores de Adega, os “outros prazeres” da vida podem ser fumar um charuto escoltado por um bom um vinho, jogar golfe na África do Sul, ou comprar relógios de R$ 8 mil ou R$ 9 mil. “Não queremos ser uma revista chata, que tenha matérias em excesso sobre degustações de vinho”, afirma Copello. A tiragem inicial da publicação é de 30 mil exemplares, que podem ser encontrados nas principais bancas do país. No site da editora Inner, é possível fazer uma assinatura que dá direito a 15 edições da revista por R$ 120,00.

Site de vinhos de Veja São Paulo — Desde setembro de 2004, o portal Veja São Paulo, braço online da revista Veja São Paulo, uma das edições regionais da Veja nacional, mantém uma seção de vinhos de acesso aberto a qualquer internauta. Não é necessário ser assinante da publicação para ler as dicas e reportagems sobre o fermentado de uvas publicadas no site (outras áreas do portal são de acesso exclusivo para assinantes). Basta entrar no endereço www.vejinha.abril.com.br/bares_restaurantes/vinhos para dar uma espiada na seção de vinhos da Vejinha, como os paulistas chamam a publicação regional. “Apesar de ser um tema segmentado, vinho interessa aos nossos leitores” diz o jornalista e enófilo Roberto Gerosa, que edita os textos da seção. Tudo que acontece em São Paulo em torno do mundo do vinho – feiras, exposições, degustações, personalidades – interessa ao segmento vínico da Vejinha digital. Há muitas matérias de serviço, com endereços de importadores e de lojas de vinhos, dicas de restaurantes com boas cartas de tintos e brancos, além de um glossário que explica como são as principais variedades de uvas. “Procuramos evitar jargões”, explica Gerosa. “Não fazemos o papel de críticos especializados. Queremos atingir o leitor que está se iniciando no mundo do vinho.” A seção reproduz os textos sobre a bebida publicados na edição impressa da Vejinha, mas não se limita a isso. Também produz conteúdo exclusivo – a sommelière Alexandra Corvo, por exemplo, tem uma coluna onde tira dúvidas dos internautas sobre a bebida — e republica matérias feitas por outras publicações da editora Abril, como a Exame e a Playboy.

Vinho Magazine — A mais antiga revista brasileira especializada em tintos e brancos surgiu em janeiro de 1999. A idéia de criar a publicação ganhou corpo durante uma viagem etílica ao Napa Valley, uma das mais famosas regiões produtoras de vinho na Califórnia, feita em 1998 por uma dupla de amigos, Eduardo Viotti e Dagoberto Caldas. No périplo enológico, Viotti e Caldas se espantaram com o número de publicações norte-americanas sobre a bebida. Na volta ao Brasil, resolveram lançar uma revista nacional voltada para esse fascinante e delicioso tema. Jornalista, Viotti já tinha naquela época uma pequena editora em São Paulo, a Market Press, a cujo catálogo adicionou então mais um título, a Vinho Magazine. Com cerca de 80 páginas editoriais, num formato maior que o da maioria das revistas (23 cm por 30 cm), Vinho Magazine é um veículo com periodicidade quase mensal. “Por conta da sazonalidade no mercado de vinhos, sobretudo no verão, publicamos geralmente onze edições por ano”, explica, com bom humor e transparência, Viotti. A revista tira atualmente 25 mil cópias. “Mas já tivemos picos de 40 mil exemplares”, diz o editor de Vinho Magazine. O caráter do veículo é eminentemente jornalístico: publica notícias sobre novos produtos e produtores, relatos de degustações, matérias mais técnicas, dicas de harmonizações de pratos e vinhos. “Nosso compromisso é com o leitor. A parte jornalística da revista é independente do setor de publicidade”, assegura Viotti. Em banca, a revista custa R$ 10,90 e a assinatura que dá direito a receber doze números sai por R$ 130,00. Há cerca de cinco meses, a publicação mantém um programa de meia hora na TV sobre vinhos, que vai ao ar aos sábados das 16h00 às 16h30 pelo Canal 21.

Bon Vivant — Criado pelo enólogo Adolfo Lona, em Garibaldi-RS, o Bon Vivant teve sua primeira edição em dezembro de 1998. O editorial já anunciava que “o vinho será o tema”, aliado também a matérias prazerozas, dirigidas às pessoas preocupadas com sua qualidade de vida. A partir de 2005, o título do Bon Vivant foi transferido para a Editora Século Novo, de Flores da Cunha/RS, iniciando uma segunda fase na vida do periódico. Tem sua linha editorial voltada prioritariamente para a produção, mercado e informações relativas à vitinicultura brasileira. Com periodicidade mensal, é dirigido a assinantes e agora amplia sua circulação para venda avulsa em bancas por R$ 3,50 ao exemplar. A assinatura anual pode ser feita através do endereço assinatura@jornalbonvivant.com.br por R$ 45,00 anuais. Além de ser o primeiro jornal sobre vinho no Brasil, é também o primeiro que está sendo comercializado em supermercados, junto à seção de vinhos. Numa parceria com a rede Sonae Distribuição, o Bon Vivant é disponibilizado para lojas das bandeiras Big, Nacional e Febernati, no Rio Grande do Sul. Em breve vai estar em bancas da capital paulista e Brasília, no Distrito Federal.

*Esta reportagem foi originalmente publicada na edição de setembro de 2005 do jornal Bon Vivant.

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